A tecnologia dos sentidos. Cientistas aperfeiçoam a natureza ao criarem ouvidos, narizes e olhos mais sensíveis que os nossos e os dos insetos.
O engenheiro indiano Rahul Sarpeshkar é um dos mais conceituados cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos EUA. Atravessou a última década estudando a anatomia do ouvido humano fora do horário de seu expediente. Parecia hobby ou excentricidade, mas era trabalho duro. Na semana passada, o MIT anunciou a criação do mais veloz instrumento de captação de sons, incluídos aqueles que são inaudíveis ao homem. Trata-se do chip chamado RF Cochlea, capaz de distinguir uma infinidade de ruídos que nos cercam e que, em muitos casos, nem sequer percebemos.
“Quanto mais estudava o sistema auditivo, mais me convencia de que ele é uma espécie de aparelho de rádio muito especial”, disse Sarpeshkar à ISTOÉ. “São cerca de 3,5 mil canais paralelos distinguindo até 400 mil sons. Meu sonho era o de reproduzir isso no campo da tecnologia. Consegui.” O RF Cochlea é, na verdade, como o Corti do ouvido humano, que apresenta em sua superfície células sensíveis que reagem a sons provocando vibrações de fibras nervosas e enviando ao cérebro um impulso de determinada frequência.
Passando das células para o chip, o novo ouvido tecnológico possui embutido nele uma diminuta placa de silício (1,5 milímetro por 3 milímetros) que funciona como o analisador dos sinais que viajam pelo ar, captando ondas eletromagnéticas. Instalado, por exemplo, em dispositivos sem fio como celulares, o chip opera como uma espécie de antena — só que muito mais potente do que as antenas que já conhecemos.
“As ligações serão infinitamente mais claras. Perda de sinal? Isso nunca mais acontecerá. As conexões sem fio vão evoluir”, diz Sarpeshkar.
Também no campo de outro sentido humano, o olfato, a tecnologia copia a natureza – ou, melhor, a aprimora. Um helicóptero-robô acaba de ser desenvolvido para auxiliar a polícia holandesa – ele fareja plantações de maconha em residências. Os moradores da periferia de Doetinchem se surpreenderam na semana passada quando, em vez da rotineira patrulha policial, um helicóptero com cerca de um metro de comprimento sobrevoou casas e em menos de 30 minutos descobriu uma vasta plantação de maconha.
O mérito do Canna Chopper deve-se ao seu sistema digital que simula nosso olfato. Foram muitos estudos em busca de um mecanismo que “imitasse” o nariz: receptores capturam as diferentes moléculas que chegam em tempos e velocidades diferentes e fornecem ao cérebro uma gigantesca gama de sinais que são interpretados como odores diversos. “No caso do nariz eletrônico, o papel dos receptores é desempenhado por uma minúscula matriz eletroquímica”, disse à ISTOE Jan Verhagen, engenheiro responsável pelo helicóptero.
Em vez de desenvolver uma tecnologia dos sentidos observando seres humanos, o cientista chinês Luke Lee, da Universidade de Berkeley, nos EUA, fixou-se nos olhos das abelhas. “Eles abrangem um ângulo de 360 graus, algo extraordinário para nós”, diz Lee. Esse fenômeno se dá porque possuem milhares de minúsculas “unidades óticas” que apontam em todas as direções e são dotadas de lentes, guia de luz e fotorreceptores – assimilam milhares de objetos de uma única cena.
O olho artificial desenvolvido por Lee, seguindo esse modelo, possui mais de oito mil unidades, constituída cada uma delas por um moderno conjunto de circuitos capazes de capturar milhares de imagens com extrema nitidez.
“Em cada uma dessas unidades instalamos uma microlente que visualiza a imagem, um cone de polímero que a transmite a computadores, um guia de onda que regula a luz, deixando essa imagem mais nítida, e um fotodetector que finaliza o processo”, diz Lee.
O seu novo circuito será acoplado a câmeras de vigilância para garantir a segurança de qualquer local, não importando, por exemplo, a que velocidade uma pessoa se movimente diante delas – tudo será registrado com a rapidez e a fidelidade com as quais uma abelha observa a natureza em seus voos. “As supermáquinas só podem surgir da evolução de outra supermáquina. Seria difícil reproduzir os sentidos sem um molde”, diz Sarpeshkar, engenheiro do MIT. Serviram de moldes, em todos esses casos, nós e a abelhas.
Fonte : Luciana Sgarbi – Terra